Bicicleta, biciclete, bicla, bicicleta montanha, bmx… São alguns dos termos que me lembro de chamar às minhas bicicletas. Ainda me lembro da primeira bicicleta, que já merecia realmente esse nome, bicicleta. Era uma BMX, agora chamam-lhes outras coisas. Lembro de pegar na minha bmx e 9 ou 10 anos ir para a escola, pelas ruas da vila, subindo aos passeios, mandando uns saltos nas lombas, fazendo raspagens de lado (agora chama-se drift) nas curvas, andando sem mãos no guiador. Cresci, e nessa altura quando crescíamos tínhamos de ter uma bicicleta maior, não como agora que gaiatos de quase 2m usam as bmx pequenas para manobras. Veio a prenda dos anos, uma fantástica “bicicleta de montanha”. Da marca da altura, Lialsan, ou parecido, com shimano aqui e ali, rodas “enormes” 26, e o sonho de qualquer rapazola da altura, tinha mudanças, 18. E começaram as aventuras “de montanha”, subidas íngremes em 1ª, descidas a 300 (a mim parecia, J ) em 18ª. Ia com ela para qualquer lado, sempre com o cadeado atrás simplesmente para prender ao quadro, porque naquela altura não se retiravam as rodas simplesmente com um desapertar de parafuso. Andava por toda a vila, ia até ao salão de jogos, ao clube desportivo, ia aos treinos disto ou aquilo, até saía com ela à noite para ir beber uma mini. Não, minto, mini é agora, porque dantes bebiam os mais velhos uma cerveja (média), ou os mais novos como eu bebiam uma Coca-Cola e já era um mimo. Lembro-me das acrobacias que fazia com ela, andar sem mãos nos passeios, sacar um cavalinho ou uma égua, etc. Lembro também de ir ao chão, esfolar os cotovelos, joelhos, palmas das mãos e muito mais.
E isto porquê? Porque naquela altura a bicicleta era vista como um meio de transporte. Eram os miúdos a ir para a escola ou outro lado qualquer nas suas bicicletas montanha ou bmx, eram os senhores das boinas, vulgo velhotes, a ir para a taberna ou para os bancos de jardim nas suas pasteleiras, eram as senhoras a ir nas suas bicicletas de quadro rebaixado às compras. A bicicleta, o nosso meio de transporte. A nossa companheira de alegrias e agonias, pelo bom de passear mas também pelas quedas que dávamos. Outros tempos…
Agora, bicicleta já não existe. Agora há BMX para acrobacias, BTT para passeios “offroad”, bicicleta de downhill para as provas da especialidade, bicicleta de estrada para o cicloturismo, e outros géneros específicos. E como meio de transporte? Ainda há? Acredito que sim, mas pouco. Agora as pessoas compram uma BTT para passear ao domingo, apenas por ciclovias ou descampados. As pessoas compram bicicletas de estrada para dar um passeio com os colegas, mas somente por sítios de pouco trânsito. Compra-se bicicletas de manutenção para queimar umas calorias sem sair de casa. E porquê?
Eu sou dos que tem uma BTT para passeios offroad, e uma de estrada para passeio de domingo. Mas pego na minha “BTT”, mais ágil, para ir aqui ou ali sempre que necessário. Eu continuo a ir ao café com ela, continuo a ir fazer alguma coisa com ela que seja necessário. E para passeio corrido, sim, uso a outra.
E certo dia aconteceu-me uma que me fez escrever este texto. Certo dia saí com a minha bicicleta para ir para o trabalho. Lá fui eu, por entre o trânsito, com cuidados redobrados. E no final do trabalho, o regresso. Tal como as motos o fazem, lá vim eu esgueirando-me por entre os carros, passando por cima deste ou daquele passeio, quando de repente ouço uma buzinadela e alguém a gritar muito indignado “mas agora já se anda pela estrada???”. Podia ter respondido pior, mas lá respondi “Porquê? Não se pode?”.
Ao que parece a mentalidade das pessoas mudou e muito, para pior. Hoje em dia bicicleta é somente para lazer e só nos sítios “apropriados”. Muito boa gente se espanta ao ver uma bicicleta no meio do trânsito, como meio de transporte.
É esta a mentalidade que “temos”? É realmente de se ficar triste. Muitos hábitos se estão a perder, alguns deles bem saudáveis..